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A necessidade de deixar chover

A terra seca quando falta água. Sem água não há frutos, não há flores, não há verde, não há beleza. Sem frutos não há vida, a terra não cumpre seu principal papel. Sem água não há vida.

A terra usa a chuva para ser terra. Ela lava, limpa, leva embora o lixo e a sujeira. Ela também ajuda as sementes germinarem, as pequenas plantas a crescerem, deixa os animais matarem a sede. A chuva também refresca, alivia, dá novo frescor. Faz renascer.

Quando não deixamos chover dentro de nós, não liberamos os sentimentos, as dores e angústias. É como se deixássemos de viver e ficássemos apenas presos, olhando o deserto que se formou à nossa volta. Os desertos internos são construídos por nós mesmos, quando teimamos em permanecer no meio do nada e apenas contemplando o silêncio e o nada.

É preciso deixar chover quantas vezes precisarmos. “A chuva lava o que já passou, resta somente o que eu já vivi, resta somente o que ainda sou”, diz a música. Ela é parte do processo de cura e libertação do nosso próprio sentido, daquilo que realmente somos.

A chuva libera espaço para o novo, a força da água leva tudo embora com a enxurrada. Às vezes o entulho é muito grande e precisamos deixar chover várias vezes. Mas precisamos deixar a água lavar nosso sentimento.

Conheço muitas pessoas que querem amar e serem amadas, mas trazem dentro de si um deserto cheio de entulhos de antigas e fracassadas construções. Ninguém é tolo a ponto de atravessar um deserto sozinho sem recompensa certa. Entretanto, ofereça um jardim florido e por lá qualquer um fará morada.

Mesmo assim, muitos viajantes passam e levam consigo um pouco da beleza do nosso jardim. Nós também colhemos flores aqui e ali e nem por isso as plantas morrem. Após a primeira chuva ela já está pronta para brotar outra flor e depois outra e mais outra… E quantas mais forem necessárias. As flores levadas murcham: falta um adubo que só um sentimento honesto fornece.

Outros, entretanto, zombam. Eles esquecem que um sentimento verdadeiro é o jardim mais florido que existe, um Éden particular. Devemos expulsá-los do nosso paraíso particular: não com a dureza da vingança, mas com a certeza de que não precisamos de alguém que vá cultivar de forma errada aquilo que guardamos de forma especial.

E não há jardim florido sem chuva. Não há amor em um coração que apenas olha o passado estilhaçado e fica revirando os entulhos para se reconstruir com base naquilo que deu errado.

A chuva pode transformar o entulho mais feio e seco em uma linda plantação. Basta você deixar ela cair.

Publicado emCrônicas

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